Prurido, ardor, corrimento e desconforto íntimo são sintomas que afectam muitas mulheres em algum momento da vida. Candidíase e vaginose bacteriana são infecções vaginais comuns, mas ainda rodeadas de tabus e desinformação. Felizmente, a ciência tem vindo a explorar com rigor alternativas naturais para aliviar e prevenir estes episódios – e entre elas, destaca-se uma velha conhecida do frigorífico: o iogurte natural.
Probióticos e saúde vaginal: uma ligação mais íntima do que se imagina
Quando se fala em probióticos, é comum associá-los à saúde intestinal. No entanto, a flora vaginal partilha muitas das bactérias benéficas presentes no intestino, como os Lactobacillus, que ajudam a manter um pH vaginal saudável, tipicamente ácido (entre 3,8 e 4,5). Este ambiente inóspito para microorganismos patogénicos dificulta a proliferação da Candida albicans – o fungo responsável pela candidíase – e das bactérias associadas à vaginose.
Estudos recentes indicam que tanto o consumo oral como a aplicação tópica de probióticos podem ajudar a restaurar o equilíbrio da microbiota vaginal. A aplicação directa de iogurte natural, rico em culturas vivas, tem sido investigada como coadjuvante no alívio de sintomas e na recuperação da flora.
Iogurte natural (e Bio): uso tópico é eficaz?
Embora pareça insólito, a aplicação tópica de iogurte natural sem açúcar (idealmente com culturas vivas de Lactobacillus acidophilus) tem evidência científica a seu favor. Um estudo publicado no Journal of Obstetrics and Gynaecology (2022) demonstrou que mulheres que usaram iogurte topicamente durante episódios de candidíase tiveram uma recuperação mais rápida e menos reincidências quando comparadas ao grupo que usou apenas antifúngicos convencionais.
Este efeito deve-se à capacidade dos lactobacilos competirem com os fungos e bactérias patogénicas pela adesão às células da mucosa vaginal, além de produzirem ácido láctico, que mantém o ambiente ácido e hostil à proliferação da Candida.
No entanto, é essencial salientar que o iogurte deve ser natural, se possível biológico sem açúcares adicionados ou conservantes, e que a sua aplicação deve ser feita com cuidado e higiene. O uso excessivo ou inadequado pode causar irritação ou desequilíbrios adicionais.
O corpo humano tem mecanismos notáveis de equilíbrio – e quando estes se desequilibram, a natureza pode ajudar a restaurar a harmonia. O uso de iogurte natural como tratamento complementar da candidíase e a ingestão de probióticos orais para fortalecer a flora vaginal mostram como soluções simples podem ser eficazes, desde que informadas pela ciência e usadas com bom senso.
Açúcar, farinha branca e candidíase: o papel da dieta
Não é apenas o que se aplica que importa – o que se come também conta. O consumo excessivo de açúcar e alimentos refinados pode alimentar directamente a Candida, promovendo a sua multiplicação. Como explica a ginecologista Fernanda Schier de Fraga, da PUCPR, “há uma íntima ligação entre uma microbiota intestinal enfraquecida e infecções vaginais recorrentes”. Uma dieta rica em vegetais, fibras e alimentos fermentados (como o iogurte, kefir e chucrute) pode ser uma importante aliada na prevenção.
Além disso, manter o sistema imunitário forte – com sono adequado, gestão do stress e suplementação de vitamina D, zinco e ferro quando necessário – é essencial para evitar episódios repetidos.
Vaginose bacteriana: também pode beneficiar de abordagens naturais?
Embora causada por um desequilíbrio bacteriano (e não por um fungo, como a candidíase), a vaginose também se relaciona com a perda de lactobacilos. Nesse sentido, probióticos vaginais ou orais contendo Lactobacillus crispatus ou L. rhamnosus mostraram eficácia em diversos estudos clínicos, reduzindo episódios de vaginose recorrente e melhorando o odor e a secreção característica desta condição.
Quando procurar um profissional de saúde?
Apesar das promessas dos tratamentos naturais, é crucial lembrar que nem todas as infecções podem (ou devem) ser tratadas em casa. O diagnóstico correcto é fundamental, já que candidíase e vaginose podem ter sintomas semelhantes, mas requerem abordagens distintas. A automedicação – mesmo com soluções naturais – deve ser feita com precaução e sempre idealmente com orientação de um profissional de saúde.
Fontes:
-
“Yogurt containing Lactobacillus acidophilus as an adjuvant treatment for vulvovaginal candidiasis”
Journal of Obstetrics and Gynaecology, 2022
https://doi.org/10.1080/01443615.2022.2034794 -
“Probiotics for the treatment of bacterial vaginosis: a systematic review and meta-analysis”
BJOG: An International Journal of Obstetrics & Gynaecology, 2021
https://doi.org/10.1111/1471-0528.16465 -
“Vaginal microbiome and the use of probiotics”
Obstetrics & Gynecology Science, 2020
https://doi.org/10.5468/ogs.2020.63.2.110 -
“The effect of diet on the vaginal microbiota and health: A narrative review”
Molecular Nutrition & Food Research, 2023
https://doi.org/10.1002/mnfr.202200820